segunda-feira, 8 de setembro de 2014

Um testemunho


Testemunho – Agosto de 2014
 

Aqui ficam algumas palavras de quem participou pela primeira vez na ajuda aos sem-abrigo...
Durante muitos anos, quando circulava pela cidade do Porto e me deparava com estes homens e mulheres, simplesmente tentava ignorá-los, fugia deles exatamente para não sentir qualquer tipo de piedade. A voz da consciência alertava-me, mas, rapidamente, inundava-me o pensamento de que o dinheiro que lhes podia dar era para alimentar os seus vícios. Outras vezes, quanto estacionava o carro, lá dava a moeda para não o riscarem ou não o estragarem. Era assim que eu via estas pessoas. De facto, para mim, eram invisíveis e, sobretudo, incómodas, sujando as ruas do Porto.
Entretanto, o meu coração mudou, pois senti que é nestes pobres homens e mulheres, que por uma alguma razão vão parar à rua, que está verdadeiramente Jesus. Nos pobres, entre os mais pobres, nos doentes, nos marginalizados, está o nosso Jesus. Foi esta a razão que me levou a participar na distribuição de alimentos, não pensando nos medos, na sujidade, na doença que ia enfrentar.
Começámos pela Rua Júlio Dinis, passámos pela Câmara do Porto e acabámos na Batalha. Ao encontrar estes homens e mulheres com as vidas totalmente destroçadas, percebi o sentimento de impotência face a tantos problemas. Como gostaríamos de mudar radicalmente, com uma varinha de condão, a vida destas pessoas! Na verdade, senti que pouco ou nada podemos fazer, porque o grande problema delas é a falta de amor, que é a maior de todas as pobrezas.
No entanto, fui-me apercebendo de que cada um de nós tem um papel muito importante, de que o nosso trabalho é uma gota no oceano, mas sem ele o oceano seria menor, como dizia a Madre Teresa de Calcutá. Um sorriso, um conselho, uma palavra de consolo pode ter um eco infindável, já que pode evitar suicídios, mais inquietações e problemas e quem sabe...  levar uma esperança e a luz de Cristo.
De todos as pessoas com quem falei, aquela que mais me tocou foi o Luís. É de Viana do Castelo, dorme junto ao antigo cinema Batalha. Era casado, tem uma filha e vivia com a família em França. A vida levou-o à rua, mas a filha de vinte anos não sabe. Perguntámos se queria rezar uma Avé-Maria connosco. Disse que não. Perguntámos-lhe se, uma vez que não queria, nós podíamos rezar por ele. Com muita pena e lágrimas nos olhos, disse que não conseguia, pois sentia-se bloqueado e com o coração ressentido, sem perdoar.     
 Rezaremos nós por ti, Luís, com a esperança de que Maria te console no Seu regaço e de que Jesus te dê a força para te levantares e reconstruíres a tua vida, porque esta é preciosa aos olhos de Deus.
Louvado seja Jesus e Maria por esta noite, em que no meio da miséria e da escuridão brilhou a esperança, o amor e a caridade!
Ana
 
          

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