sábado, 26 de dezembro de 2009


No meio da azáfama característica desta quadra, e com o senão de termos interrompido esses afazeres por causa imprevista, deixámos passar o dia de Natal sem que aqui o tivéssemos lembrado...
O Natal deve ser todos os dias, costuma ouvir-se. É verdade, mas embora o afirmemos sempre também sempre depressa o esquecemos...
De qualquer modo, e para que conste, desejamos a todos UM MUITO SANTO NATAL, e que o Deus-Menino permaneça e cresça sempre cada vez mais nos nossos corações.
E aproveitamos para desejar que o Ano de 2010, que brevemente se vai iniciar, preencha os desejos de cada um quanto à sua vida particular, e a todos traga a tão ansiada PAZ, Saúde, Pão, FELICIDADE!...
São os votos de franjas sociais.
C.

INÊS...

"Esta manhã (24/12) fui ao enterro da Inês às 11h em Vilar de Andorinho. Lindo. Já ontem à noite quando fui à capela mortuária com a Cuca e a Manela rezar um terço tive ocasião de perceber "aquele" sorriso tão misterioso nos olhos fechados dela. Foi um consolo.
Hoje houve uma cerimónia muito bonita - com a celebração da Palavra, uma homilia e a distribuição da Comunhão na Capela Matriz.
A Manela leu as leituras tão bonitas do Natal: "O povo que andava nas trevas viu uma grande luz. Para aqueles que habitavam nas sombras da morte uma luz começou a brilhar", e o Salvador - de que ela tanto gostava no que era correspondida, leu a oração dos fiéis pedindo "pelas famílias que nesta noite não têm casa, nem pão, nem amor...". Tudo girava à volta da vida da nossa querida Inês que, com a fotografia da entrega da caixa dos sonhos na Missa de Natal da Trindade ao lado dela no caixão, continuava a sorrir como se nos quisesse sossegar e dizer: "acabou-se a luta, estou em paz, mas... atenção! Continuo convosco".
O diácono que presidiu falou com uma sabedoria muito grande explicando que há filhos que estão mais perto e outros mais longe da família e da casa mas que nunca saem verdadeiramente dos corações dos seus pais. E se é assim no coração dos pais da terra, muito mais o é no coração do Pai do Céu - n'ELE nunca deixa de caber um filho. São nove irmãos e uma mãe de alguma idade.
Foram buscá-la ao Instituto de Medicina Legal logo que souberam que tinha morrido e levaram-na de volta à terra donde nasceu, enterraram-na com muita dignidade, e foi de lá que partiu para a sua definitiva morada. EM PAZ.Vai-nos custar esquecê-la... aquele jeito atolambado de ser, de se rir, aqueles passos gigantescos capazes de ultrapassar o tempo, aquele sorriso malandro e terno, os abaços sem fim... e, um segredo: a boneca...
Um dia contou-nos que foi mãe há perto de 7 anos. Entregou a filha ao médico que a assistiu no parto quando este lhe mostrou a evidência - que ela não teria nunca capacidades de educar uma criança no coreto do Jardim da Cordoaria. E era com uma boneca, a que vivia agarrada toda a noite, que ela compensava a dor e as saudades que tinha da Sofia.
A Cuca andou como louca de um lado para o outro nos sítios que sabemos terem sido os últimos momentos dela, à procura da boneca para hoje lha entregar. Em vão. Mas não importa porque agora, do Céu onde andará de um lado para o outro aos encontrões a tudo e a todos, ela pode olhar e gozar bem de perto a sua menina.Descansa em paz, Inês!"
(Texto da Teresa Olazabal)
Da minha parte quero-te dizer que não sabia nem imaginava que no passado dia 14, na Trindade, te estavas a despedir quando, à socapa, me vieste dar "aquele" abraço e me pespegaste dois sonoros beijos na face.
Ao pensar nisso sinto como que uma dívida para contigo: a de nunca te esquecer, e, especialmente, não deixar de rezar por ti. É o que vou procurar fazer. Que o que te faltou em vida em comodidades, atenção e carinho, te sobeje agora no Céu em Graça e Felicidade Eterna. E lembra-te também sempre de nós junto do ETERNO DEUS!

PNAM

Carlos

terça-feira, 22 de dezembro de 2009


"...A arma dos fortes foi destruida e os fracos revestidos de força.Os que viviam na abundancia andam em busca de pão e os que tinham fome foram saciados..."
(Do Salmo da Missa de hoje, 1Sm2, 1.4-5.6-7)
"A "nossa" Inês foi ontem para o Céu.
Dormindo na rua durante 25 anos, foi recolhida e reabilitada pelo nosso grupo.
Não sabia o que era uma cama.
Mas teve uma recaída há 15 dias.
Voltou para a rua e para o inferno da vida anterior.
Presa durante a noite, morreu não sabemos porquê.
No Ofertório da Missa de Natal fez questão de levar a "caixa dos sonhos". E fê-lo com uma convicção e uma dignidade total.
Agarrada com unhas e dentes à caixa, entregou no altar os seus sonhos: "- o de um dia poder viver dignamente: com emprego, casa e familia; - o de um dia poder ser olhada com respeito por todas as pessoas; - o de um dia poder ser livre, sem dependencias e sem precisar de estender a mão.

Como dizia há pouco uma amiga, agora vai realizá-los todos. Porque na verdade não era a "nossa" Inês mas sim a Inês "de Jesus" porque "a mais pequenina dos pequeninos" de tão mal amada, de tão maltratada, de tão despezada...

Inconsoláveis, acreditamos nas palavras deste Salmo:
"os que tinham fome foram saciados".
A Inês tinha uma fome insaciável de amor. E umas gargalhadas de menina. Abraçava toda a gente com a força de quem acredita que isso lhe minimizaria o sofrimento provocado pelas tantas feridas que tinha no coração e de que não se conseguia livrar...
"...Os fracos foram revestidos de força e os que tinham fome foram saciados...!"

(Teresa Olazabal)

Comentário:

Inês:
Quem disse que a Missa de Natal a 14 de Dezembro era prematura?
Pois foi a tua Missa de Natal!... Celebraste também este ano o teu Natal, o Natal de Jesus...
Tal como escreveu a amiga Teresa, abraçavas toda a gente, querias viver num momento o que não te era permitido usufruir ao longo da vida. Mas... naquele abraço que, por puro impulso teu, me vieste dar de surpresa na Igreja da Trindade, vejo agora o teu abraço de despedida!...
A vida foi muito madrasta para ti, mas que tudo quanto te deram em sofrimento te seja agora dado no Céu em recompensa por toda a eternidade!...
Elevamos ao Céu as nossas orações mas estou certo de que não precisarás delas, e, por isso te peço: Pede a Deus por nós!...
P.N.A.M.
Carlos

terça-feira, 15 de dezembro de 2009

Missa de Natal dos Sem-abrigo




"Mais do que comentários, deixo aqui os tres pontos altos da Missa:
Ofertório, Pai Nosso, Poema da Margarida
O OFERTÓRIO
Foram oferecidos ao Senhor presentes - dos Amigos da Rua e do nosso grupo - que eram mostrados ao povo de Deus ali reunido, enquanto a Joana lia pausadamente o sentido de cada entrega:
A Laura e o João, um casal da rua, aproximam-se do altar com uma caixa de cartão dobrada e um cobertor:
"Oferecemos-Te Senhor a nossa cama muitas vezes o único conforto na solidão e no frio das noites compridas de inverno. Tu, que também nasceste no desconforto da manjedoura, acolhe-nos e aquece os nossos corações com o Teu Amor".
A Sónia, mãe de três filhos, no desemprego, bem como o marido, aproxima-se do altar com um pão seco:
"Oferecemos-Te Senhor este pão, sinal da nossa carência e da nossa fome: fome de alimentos, fome de carinho, fome de companhia. Tu que mataste a fome aos famintos, sê o Pão, o alimento, e o amor das nossas vidas".
A Marta, do nosso grupo, aproxima-se do altar com um recipiente cheio de cacos, de várias cores:
Oferecemos-Te Senhor estes cacos, sinal das nossas vidas tantas vezes estragadas, fúteis, partidas e sem sentido. Dá-nos, Senhor, a Tua ajuda e refaz as nossas esperanças e alegrias tantas vezes quebradas e perdidas.
A Joana, do nosso grupo, aproxima-se do altar com um "saco-ternura":
Oferecemos-Te, Senhor, este saco de plástico a que chamamos "saco-ternura" onde todos os meses colocamos não só os alimentos para os Amigos da Rua, mas também o nosso amor, a nossa atenção, a nossa companhia e a nossa alegria em podermos partilhar com eles as nossas vidas. E nunca permitas que desanimemos de servir-Te nestes irmãos e irmãs.
A Inês, sem-abrigo, leva uma caixa "doirada" com tres papeis escritos:
Oferecemos-Te, Senhor, estes nossos sonhos: - de um dia podermos viver dignamente com emprego, casa e familia; - o de um dia podermos ser olhados com respeito por todas as pessoas; - o de um dia podermos ser livres, sem dependências e sem percisarmos que estender a mão para satisfazer as nossas necessidades essenciais. Senhor, alimenta e anima cada vez mais estes nossos sonhos.
A Rosa e o Armando, dois Amigos da Rua, aproximam-se do altar com as hóstias e as galhetas:
Oferecemos-Te, Senhor, o pão e o vinho que em breve se irão transformar em Jesus, o Alimento que vem do Céu. Com este pão e este vinho vão as nossas dores, trabalhos e solidões. Aceita-os, Senhor.
O PAI NOSSO

O Senhor Padre Fabião convidou-nos a dar as mãos de maneira a que não houvesse uma mão desgarrada, solta, sozinha. E a Igreja transformou-se como que por magia num imenso cordão que incluía o altar e ía até ao último banco. Pediu-nos um instante de silêncio que de tão calado pesou fundo nos corações e rezámos emocionadamente não só o Pai Nosso como as orações seguintes numa comunhão imensa, incrível.
O POEMA DA MARGARIDA:

O Poema da Margarida... é "simplesmente" este... que a Rosarinho nos fez chegar numa leitura feita directamente do coração:
"Irmão meu, filho do mesmo DeusQue nos criou num milagre de amorQuero hoje entregar-lhe as tuas mágoasEstar contigo, firme, a implorar com fervor:Que me livre do egoísmo que me cega,Das comodidades que tenho sem merecer,De não te dar a mão, peregrino das ruas,De não ser uma esperança para o teu viver.Quero ajudar-te , mas…sozinha não consigoDar-te pão, carinho, dar-te abrigo,Ser luz na tua noite, maná das tuas fomesQue por tantas que são, nem sei delas os nomes…Irmão meu, alegra-te, há ALGUÉM poderosoQue o nosso impossível pode realizarTe olha e te ampara com amor de PaiE, por amor nasceu para nos salvar.O Menino do Presépio é o mesmo DeusQue continua hoje a olhar-te com amorIrmão meu, testemunha de dolorosas horas,De noites gélidas, sem pão e sem calor.Levanta-te do chão e olha o Céu aberto!Olha Jesus a dar-te a mão e num abraçoElevar-te da terra ao infinito espaço!Para te fazer sentir toda a consolação,Toda a misericórdia, toda a redençãoO seu imenso amor, o seu total perdãoSua entrega total, sem nenhuma condição.Dá-lhe a tua mão irmão e sente o seu abraço,Agarra-a com força, e vais ver que és capazDe mudar pouco a pouco a tua vida,Sentir no coração o bálsamo da Sua Paz."
Margarida Martins Alves, Natal 2009
Depois, "O SOCIAL" cá fóra:
"Sacos-ternura"; presentes para homens, senhoras e crianças; perú "acompanhado"; bolo rei, chocolate quente, sumos, café e Vinho do Porto. Para além da generosidade de todos, não poderia deixar de agradecer à Zé Pinho que forneceu o perú e ao Luis Vieira de Castro que ofereceu o Bolo Rei.
O Largo da Trindade era um imenso sorriso... Os olhares eram estrelas cheias de Luz... As palavras que mais nos chegavam era um "obrigada, e que o Senhor vos acrescente".
É pois com estas mesmas palavras que termino esta "notícia":
"OBRIGADA, E QUE O SENHOR VOS ACRESCENTE!"
AMEN - ALELUIA"

(Relatado por Teresa Olazabal)