terça-feira, 17 de fevereiro de 2009

Ainda o dia 11/2

«Tocar o intocável»
Começou cedo a minha preparação para visitar os nossos amigos e irmãos espalhados por diversos pontos da cidade do Porto. De manhãzinha, depois de concluir as minhas tarefas, passei de imediato à segunda fase do plano, que consistiu em preparar a ajuda que nessa noite iria juntar-se às outras.

Merenda comida, companhia desfeita, ponho-me a caminho da Igreja dos Congregados para me confessar. E, por tal não ter sido possível, detive-me em Oração na Igreja. Ao saír, alguém afixava um pequeno cartaz informativo sobre as «Quarenta Horas de Oração», subordinadas ao tema «Combater a pobreza, construir a Paz». Todavia, o que mais chamou à minha atenção foi a frase escolhida para núcleo desta iniciativa «Dai-lhes vós mesmos de comer» (Mt.14.16). Esta primeira mensagem parecia especialmente para mim, pois mais logo iria para as ruas da cidade.

Já de regresso a casa, estimulado pelo que li, reflecti o quanto a acção prática completa a Oração espiritual. Não basta «dar esmola», é necessário interessar-se (amar) pela Pessoa. Olhar para o Outro e não ver nele apenas o pobrezinho mas sim e sempre o «Jesus crucificado» - que mais à noitinha haveria de aparecer numa leitura do Envangelho.

E eis que nos começamos todos a reunir para dar início à visita. Se não fosse o amigo Carlos, chegaria ao ponto de encontro muito para lá da hora combinada! Caras novas, corações cheios de Luz, motivação e ânimo renovados.

Antes de partimos para «dar de comer» aos que sofrem, uma breve reflexão da nossa missão e a leitura da Escritura. Nova mensagem quase personalizada.
Retive no pensamento a imagem do Homem que sofre por amor a todos e foi naquele Jesus crucificado que vi aqueles a quem nós íamos a «dar de comer». Alimento para Alma, comida para o corpo e conforto para o coração que sangra.

O mesmo fiz em relação às palavras dirigidas a Sua Mãe: «... eis o teu filho! (…). Eis tua mãe!». E tinha-me eu encomendado a Nª Srª de Lurdes durante a tarde para Ela vir ter connosco à noite. Era o Seu dia.

Umas centenas de metros à frente, depois das limonadas, bacalhaus e beijinhos distribuídos, vou ao encontro de quem se sentiu limitado nos movimentos. Não quer limonada? «Quero, estou com muita sede!». De repente disse, «Meu irmão, dê-me um abraço!». Hoje é dia de Nossa Senhora de Lurdes, contrapus. Reze uma Avé Maria... «Rezo todos os dias... ». E as lágrimas que escorreram por aquela face tocaram fundo no meu coração. «Lágrimas de meu Senhor Jesus Cristo...».

Quão necessário é ir ao encontro daquele que, não o pedindo, espera ser escutado e orientado. Também ele no seu sofrimento nos ensina a Vida e nos mostra o caminho. Para finalizar esta dissertação, que já vai longa, dois últimos pormenores que rematam a visita:

1º – A mensagem vinda do Carlos aquando nos despedimos, entre outras coisas que deve ser dado um passo importante no sentido de assistir e auxiliar pessoas noutros aspectos, tais como higiene, documentação, orientação, companhia, etc.
E ainda motivar a participação de todos os elementos no blog, escrevendo as suas impressões, seja em texto corrido, seja em Oração, poesia - que já está presente -, perguntas, sugestões... Enfim tudo o que nos possa tornar mais activos.
2º – Já hoje (12 de Fevereiro), ao procurar uma informação acerca das Conferências de São Vicente de Paulo, surgiu no ecrã do computador o seguinte:
«... “Jesus, compadecido, estendeu a mão, tocou-lhe e disse: Quero: fica limpo.”.
Mc. 1, 41.
Tocar o intocável:
Aprendemos que Deus está para além do visível e do palpável, distante dos sentidos com que nos dotou e que são a nossa fundamental relação com a vida e com o mundo. Também nos especializámos em marcar fronteiras entre nós: criar “ghettos” e condomínios fechados, colar o rótulo de “intocáveis” em pessoas cujas raças, doenças, e até pensamentos, são considerados “fora da norma”. Das razões sanitárias às religiosas, das desculpas sociais às políticas tudo pode servir para excluir. Mas a encarnação de Jesus convida a rever os conceitos nos quais tentamos “aprisionar” o próprio Deus. Porque Ele é o intocável que não teme tocar-nos, Ele é o invisível que se deixa ver, Ele é o cheio de compaixão que, surpreendendo todos os legalistas e bons funcionários do sagrado, tem entranhas de ternura maternal por quem sofre!».
L.

P.S. Foi neste domingo passado uma das leituras da Sagrada Escritura!

11 de Fevereiro de 2009

Nossa Senhora de Lourdes

"-Eu Sou A Imaculada Conceição"!


Esta afirmação solene serviria de guia para esta nossa noite. Noite marcadamente diferente pelo insólito, pelo inesperado, pelo improviso, sob a tutela sempre presente de MARIA...
-"Estou num curso, não posso ir!", - disse uma;
-"Tenho reunião de crismados!", - disse outro;
- "A E.... não pode ir hoje!", - informou uma amiga.
Três falhas de peso e de importância. Paciência!... Pensei; Deus providenciará. O problema reside também nos carros; Será que chegam? Outra amiga não deu sinal para arranjar as suas habituais sandes. Os que restávamos preparámos tudo como de costume. À hora habitual ninguém tinha ainda aparecido. Da minha parte tinha preparado e carregado no carro tudo o que me competia: 4 garrafões de sumo, 50 sandes, 2 caixas com bolos e salgadinhos, tangerinas, sacos vazios e 150 copos. Àquela hora já ali devia estar a Alda mas até ela faltava! Nada que me perturbasse.

Na Missa tinha colocado nas mãos da Mãe esta nossa noite a Ela especialmente dedicada. Toca o telemóvel. Era o Luís!
- Está? Sou o Luís, vou mas ainda estou a sair de casa, será que?...
- Sim! Quando chegar à Boavista dê sinal para o ir buscar lá.
Ainda bem. Faltam uns mas Deus manda outros que não eram esperados... Soa novamente o telemóvel. Desta vez é a Alda:
- Olhe, estou aqui há meia hora para entrar na autoestrada! Só há que esperar. Entretanto chega a Maria de Lurdes - de LURDES! - que não vem só. Quando me quer fazer a surpresa nas apresentações é ela que fica surpreendida, tanto como eu!- Olhe quem é!... Nós conhecemo-nos!... Pois conhecemos! Do mesmo grupo de oração, trazidas por mão alheia!... Assim a Isabel, a Laura, a Manuela, a Helena e a Esmeralda, estas duas já habituais, engrossaram o grupinho.

Toca novamente o telemóvel. O Luís precisa de boleia. Meto-me no carro, dou à chave... e nada!... Repito a operação e nada! Não há nada a fazer. Não trabalha!Remediamos com o carro da Alda. À pressa mudou-se tudo para os outros carros. Na oração pedimos a palavra para servir de mote para a nossa jornada pelas ruas da cidade, que foi tirada à sorte pela Isabel: São João, 19, 17-27: "A Crucifixão de Jesus".

Quando começou a leitura minuciosa da morte de Jesus estava eu a pensar no que é que aquela passagem tinha a ver com a nossa noite quando, ao chegar ao final, me soam claras as palavras de Jesus para Sua Mãe
- "Mulher, eis o Teu Filho!", e para o discípulo - "Eis a Tua Mãe!".
Estava feita a ligação. Maria, a Imaculada Conceição, A "Senhora de Lourdes", é Aquela que nos foi dada por Mãe aos pés da Cruz, a TODOS, mesmo aos que nos esperam nas ruas do Porto, famintos, esquecidos, ostracizados.


É o que lhes vamos dizer nesta noite, que, apesar dos males e da miséria com que são brindados pela sociedade têm no Céu uma Mãe que os estima como filhos tanto ou mais quanto estima os que dormem em camas quentinhas e fofas e com a barriguinha farta. Com esta mensagem e esta intenção demos alento a alguns rezando com eles uma Avé Maria. E, enquanto rezava, era ver rolar pelas faces de uma uma lágrima envergonhada! E o Paulo? O durão? Revoltado até à medula, violento de palavras, que só matava e esfolava?


- "Não fazes nada disso, Paulo! Tens um bom coração e isso impede-te de fazer essas asneiras! É contra o teu fundo bom...".
- Sabes rezar a Avé-Maria?
- Não! Não rezo. Não acredito em Deus...
- Mas olha que Ele não está à espera que acredites para existir! Ele existe mesmo que tu penses que não existe. A Sua existência não depende do que tu pensas ou não. Olha: vamos rezar a Avé- Maria pensando em ti como se fosse tu a rezá-la. Como só é para teu bem limita-te a ouvir, como amigo.


E começámos a rezar pausadamente. Ao mesmo tempo, o Paulo, sério, tímido, começou a rezar connosco, e, comovido, deixou esgueirar uma lágrima que se escondia sob a capa da insensibilidade! Não conto agora o que nos disse. O Paulo, posso dizer, profetizava! Sei que Deus nos acompanhava e acompanha, mas o que disse é bom demais para o contar.


A noite começou atrasada, tivemos muitos encontros em Júlio Dinis, apareceu gente com necessidade de falar, de ouvir também, de sentir o calor da amizade que lhes levávamos, desinteressada, e isso demorou-nos mais ainda. Por isso encontrámos alguns poisos desertos. Visitámos os isolados, e seguimos ao Carregal. Nova surpresa!... Sozinho, utilitário humilde, de mala aberta ostentando duas grandes panelas uma com sopa de legumes e outra com canja de galinha, e pão, o sr. M. Rocha atendia os nossos amigos.

Duas grandes panelas...

Não resisti que não lhe perguntasse:
- Quem confecciona a sopa?
- É a minha mulher!
- E vem sozinho distribui-la?
- Todas as noites!
Todas as noites estou aqui e, quando não acabo a sopa vou levâ-la por aí a outros locais, até já fui ao Aleixo.
É de pensar!... TODAS AS NOITES dois grandes panelões de sopa!... E uma só mulher a fazê-la e um só homem a distribui-la! E os gastos? Quantas vezes não esbarramos em entraves mesquinhos que nos impedem de ir mais além! Mas estes dão-nos uma grande lição: as coisas importantes são sempre simples; o que importa é querer e, quando se quer, também se faz. Tudo vai do começar, sem olhar para trás nem perder tempo a discutir os pormenores. Os pormenores virão depois. Como nos fazem pequenos estes grandes exemplos!...

Restava ir ainda ao Aleixo. Sucediam-se as caras de fome, chupadas e surradas, e, de permeio, algumas carinhas frescas onde se não apagara ainda a juventude e a esperança. Foi com essas que nos detivemos mais. Falámos-lhes na Mãe do Céu, semeámos amor, deixámos esperança. Dizia-nos uma:
- Já fiz duas desintoxicações a frio.
- Porque voltaste?
- Porque em casa não acreditavam em mim e, se fazia ou acontecia alguma coisa mal era sempre eu a culpada. "Já estás com a dose?"; "estás passada?". Não resisti. Não valia a pena andar a desintoxicar-me para nada. Voltei.
- Mas podes tentar novamente, olha que... e que... e que...
- Vou ver; talvez um dia...
- Olha, vamos pedir à Mãe que te ajude. Tens Fé?
- Vocês são de que religião?
- Católicos.
- Ah!... Eu com os Católicos vou. Acredito neles.
- Vamos dar as mãos e rezar uma Avé-Maria.E foi a última rezada na rua nesta noite, acompanhada de mais uma lágrima comovida, saída do fundo do coração de quem se sabe drogada, mas, ao menos neste pedacinho de noite, com direito a tratamento de gente. Por isso grata.
- Adeus! Boa noite!...
- ficou ela acenando à medida que o carro se afastava.

"- Mulher! Eis o Teu Filho!...";"- Filho! Eis a Tua MÃE!".

C.

domingo, 8 de fevereiro de 2009

Nova saída

No próximo dia 11 volta a ser dia de ir à rua.

Vamos preparar tudo como de costume.
Há notícia de que o Colégio do Rosário serve uma refeição completa na rua nos dias úteis da semana em certos locais da cidade, mas isso não nos impedirá de continuar a nossa volta e de deixar o nosso pequeno contributo.
Se não serve de jantar servirá de merenda para o dia seguinte!
Boa preparação.
Abraços a todos.
C.